Você se lembra, de quando precisava se comunicar, mas não tinha palavras para fazê-lo? Imagino que sua resposta tenha sido negativa…Pois é isso que os bebês fazem, falam sem palavras, e um dia você já foi um bebê.Esse tempo, primordial em nosso percurso, nos habita de uma forma que nem sequer imaginamos. Nele aconteceram as […]
21/12/2022
Chris Nicklas
Você se lembra, de quando precisava se comunicar, mas não tinha palavras para fazê-lo? Imagino que sua resposta tenha sido negativa… Pois é isso que os bebês fazem, falam sem palavras, e um dia você já foi um bebê. Esse tempo, primordial em nosso percurso, nos habita de uma forma que nem sequer imaginamos. Nele aconteceram as primeiras inscrições de prazer e desprazer que experimentamos.
Winnicott, um pediatra e psicanalista britânico, dizia que é muito importante para mães e pais terem momentos tranquilos com o filho nos braços. Afinal, quando o bebê agitado, tensiona seu corpinho, manifesta seu estado de estresse, isso pode ser muito assustador.
O início da vida com um bebê é cheio de sobressaltos para muitas famílias e, quando tudo corre bem, elas atravessam esse primeiro período como um surfista inexperiente que enfrenta pela primeira vez a arrebentação e passado o pior, cansado, olha para a praia, sentado no conforto de sua prancha e vê sua beleza. Então vem a onda, possivelmente generosa e linda, que conduz de novo à beira d’água, o mesmo ponto de partida para o enfrentamento da arrebentação. E tudo começa novamente. Poética imagem, mas você deve estar se perguntando: sim, mas e daí?
O que faço com o meu bebê quando estiver aos berros?? O que se passa com ele/a quando tem esse tipo de comportamento? Como traduzir seu corpo em palavras e pedidos passíveis de serem atendidos?
Sem fórmulas mágicas, essa pergunta encontra resposta num lugar de difícil acesso, ou seja, nos primórdios de cada um. É claro que há dicas, muitas aliás, que podem ser úteis e desenrascar pais e mães desesperados. As primeiras dizem respeito às necessidades orgânicas, como fome, sono, cólicas, gases, arrotos, frio, calor… estas, tenha certeza, são as primeiras hipóteses que devem passar pela cabeça de quem cuida de um bebê, afinal todas, especialmente as primeiras têm o potencial de desorganizar completamente esse pequeno ser, especialmente um recém nascido. O efeito dessa desorganização é um corpo enrijecido, muito choro, feições contorcidas e sofrimento. Pois é este comportamento que faz a maior confusão na cabeça e no coração dos cuidadores mais implicados.
Sentimentos de rejeição, frustração, orgulho ferido, inseguranças, pânico, tudo isso e mais um pouco pode ser experimentado por mães e pais.
E aqui chegamos a um ponto importante, pois no lidar com o próprio bebê são reativadas vivências esquecidas, que engavetamos para seguirmos com a vida. Nada errado com isso, pelo contrário, mas é preciso ter em mente que na tentativa de decodificar o bebê esbarramos com o bebê e a criancinha que fomos um dia e quando somente respondemos partir dessa posição isso significa que precisamos de ajuda, na verdade, de uma rede de apoio que sustente o nosso maternar.
Procure ajuda. Busque pessoas que te façam sentir capaz de dar conta do que se apresenta na relação com um filho.
Dar conta não significa acertar sempre, ao contrário, quer dizer que entre trancos e barrancos você, de tempos em tempos, poderá olhar para a praia e ver sua beleza. E nesses momentos, com um bebê tranquilo nos braços, sentindo seu corpinho relaxado, vai ser possível sentir o prazer de ser mãe e pai.
Sugiro que olhe para o seu bebê, observe seu corpo, sons e olhares. Diga a ele/a que você já esteve nesse mesmo lugar, mas que não se recorda, e que por isso entre encontros e desencontros vocês farão a caminhada juntos, um percurso que nada mais é que o de constituição e reconhecimento de nossa humanidade.
Chris Nicklas é psicóloga, de abordagem psicanalítica, mestre em psicologia clínica, licenciada pela Universidade Lusíada de Lisboa, membro do Centro Português de Psicanálise, co-coordenadora do núcleo de Lisboa da Rede Bebê.